Síndrome
de Dom Pedrito
Fernando Risch Garcia
@fegrisch
Primeiramente, estabelecendo contexto, sou de Bagé: nascido,
criado e onde ainda resido. A Rainha da Fronteira, lugar de belos campos e vacas
gordas, onde vinho brota aos prantos, ameaçando a serra gaúcha. Nesse subúrbio
rural, onde os campos e lavouras se expandem por toda região, dividimos o pampa
com outras cidades. Dentre elas, a setenta e seis quilômetros, nossa vizinha –
e porque não dizer irmã – Dom Pedrito.
Como irmã, Dom Pedrito é mais uma co-irmã, tudo pela
rivalidade acerca de bageenses e pedritenses estabelecida durante os anos. Nas
noitadas de Dom Pedrito, ao alarde de um bageense cortejando alguma mulher
pedritense, o sinal vermelho se acende e a pancadaria pode comer solta. O mesmo
não acontece em Bagé, talvez por ser uma cidade maior. Os pedritenses talvez se
sintam ameaçados. E não é culpa deles. E não que os homens de Bagé sejam
melhores, nada disso. É que quando chega “novidade” na cidade, algumas mulheres
tendem a se ouriçar mais. É a máxima da oferta e demanda. Enfim, há certa
resistência dos pedritenses com os bageenses.
Assistindo o jogo entre Brasil e Portugal, na última
terça-feita, essa e muitas outras histórias se embrenharam em minha mente em
relação ao Neymar. Indiscutivelmente, um jogador de ponta. Um dos grandes
craques do planeta. Só que, assim como os de Dom Pedrito têm rusgas com os de
Bagé, há aqueles que tendem a fechar os olhos ao jogador do Barcelona e inventar
conceitos completamente desproporcionais à realidade.
Contra Portugal, Neymar foi o bonitinho de Bagé que resolveu, contra
tudo e contra todos, invadir uma festa de Dom Pedrito para, digamos, “roubar”
mulheres dos pedritenses – no caso, os portugueses. Metáforas a
parte, Neymar fez um jogo justo. Não foi cai-cai, partiu pra cima, tentou
dribles, não reclamou, marcou golaço e apanhou – apanhou muito. Apanhou por ser
de Bagé. Não interessa se ele é bom ou não, ele é um bageense em Dom Pedrito.
Apanhou. Existe, sem sombra de dúvidas, uma rusga internacional com o Neymar.
Os jogadores entram predispostos a bater, a machucar e, em tentativas
desesperadas, tentar anular uma possível humilhação por um drible, com uma
botinada ou uma cotovelada.
Voltemos no tempo em poucos dias, mais precisamente no
sábado, amistoso entre Brasil e Austrália. Antes da partida, o jogador
australiano Thompson – o qual ninguém conhece e não se sabe por que sua opinião
deveria ser relevante – afirmou categoricamente que prefere o atleta Oscar ao
Neymar. Sem dúvidas Oscar é um excelente jogador, mas todos sabem que Neymar é
craque, é um patamar acima dos outros e briga contra gigantes como Messi e
Cristiano Ronaldo. Não há comparação. Pelo menos agora não.
Esse tipo de afirmação mostra claramente a resistência que o
jogador tem. Talvez por ser o garoto precoce que já ganhou muito, estampa as
principais capas de jornais e vende as maiores publicidades: um problema
claramente psicológico, atingindo o ego de muitos, quando ele representa aquilo
que todo jovem brasileiro queria ser: rico, famoso e bom de bola. E isso não é
de agora. Ao surgir, em 2010, subiu da base juntamente com Paulo Henrique
Ganso. Apesar de mostrar ser craque, com míseros dezessete anos, os
“especialistas” de plantão torciam o nariz e diziam: “o Ganso é melhor”.
Neymar fazia três gols em um jogo: “o Ganso é melhor”.
Neymar decidia uma final de campeonato: “o Ganso é melhor”. Neymar não fazia
uma partida muito boa: “Ah, viu? Enganador. Eu disse que o Ganso era melhor!”.
Puro oportunismo.
Enfim, o Ganso é um ex-jogador com 23 anos e o Neymar é
titular da Seleção Brasileira e do Barcelona. Ainda assim, Neymar tem que
provar diariamente que não é o “Novo Robinho” – o que evidentemente ele não é.
Ele é certamente um bageense dentro de uma festa em Dom Pedrito : ele pode
até mostrar que é um cara legal e da paz – no caso, jogando bem – mas os
pedritenses não vão dar ouvidos, afinal de contas: “ele é de Bagé e não deveria
estar aqui querendo nossas mulheres”. Aceitem. Contemplem. Torçam. Menos ranço
com o craque, por favor.
Neymar, o bonitinho de Bagé.
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